sexta-feira, novembro 19, 2010

Apologética cristã: uma necessidade presente

Marina Garner Assis mora atualmente em Caxias do Sul, RS, mas nasceu bem longe de lá, em Hong Kong, na China, quando o território ainda era colônia inglesa. Por isso, ela aprendeu inglês como primeira língua. Nascida em 1986, começou a cursar Nutrição, mas abandonou a faculdade para estudar Teologia no Unasp, campus Engenheiro Coelho, onde se formou em 2009. Atualmente, ela trabalha como professora de Ensino Religioso, Inglês e Educação Para a Vida na Escola Adventista de Caxias do Sul. Hobbies? Passar tempo com o marido, o pastor Luiz Gustavo Assis, jogar basquete, mergulhar nas férias, viajar e, é claro, estudar apologética, que é o tema principal desta entrevista concedida ao jornalista Michelson Borges.

O que é apologética cristã e desde quando você teve o interesse despertado para essa área?

O nome dessa área de estudos vem da palavra grega apologia, que significa “defesa”. Era o que se fazia quando o réu de um tribunal queria se defender diante das alegações feitas contra ele. A apologética cristã, portanto, é a defesa do cristianismo. Ela se divide em diversas ramificações, como a histórica, filosófica, arqueológica e científica.

Pessoalmente comecei a me interessar por essa área no primeiro ano da faculdade de Teologia e recentemente me peguei perguntando por quê. Cresci numa família sem religião, apesar de minha mãe ser católica, na época a influência maior era do meu pai que mantinha a filosofia ateia. Na adolescência, encontrei a igreja e me identifiquei muito com as crenças bíblicas. Não podia imaginar o que me esperava depois da minha entrega total a Deus e de depositar confiança irrestrita em Seu Livro. Fui repetidamente bombardeada com perguntas científicas, sobre a historicidade da Bíblia, sobre a existência de Deus, sobre a confiabilidade dos manuscritos bíblicos e questões filosóficas. Tudo isso para uma adolescente de 14 anos! Fiquei confusa e frustrada por não poder dar respostas à altura para minha família. Foi então que, com todo o acesso que eu tinha a materiais na biblioteca da faculdade, comecei a pesquisar tudo o que não sabia até então. E desde lá, a apologética se tornou minha paixão. Comecei a perceber que tudo o que eu queria escrever, ler e pesquisar estava na área da apologética. Completei dois TCCs nessa área e dois trabalhos apresentados na faculdade, além de pesquisas menores. E agora formada, continuo empenhada em aprender mais e deixar meus familiares com mais questionamentos do que eles me faziam!

Hoje, mais do que nunca, parece que essa disciplina volta a ser necessária. Você concorda? Por quê?

Acredito que desde o Renascimento, período em que as dúvidas começaram a surgir na mente até do povo mais religioso, a apologética tem sido cada vez mais necessária. Porém, nunca se viu surgimento tão grande de ateus ativistas quanto nesses últimos cinco anos. Portanto, sim, essa disciplina precisa estar na mente de todos aqueles que se dizem cristãos. O motivo? Primeiramente (e simplesmente), porque é bíblico! Pedro, o discípulo que provavelmente tinha muita dificuldade com assuntos mais intelectuais, escreveu em 1 Pedro 3:15: “Antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós.” Deus nos pede para amá-Lo com todo o nosso coração, mas também nos pede para amá-Lo com toda a nossa mente. Isso é muito sério! Quer dizer que não adianta sabermos versos de memória e irmos para a igreja; significa que precisamos pesquisar as razões pelos quais acreditamos nisso!

Apesar de haver muitos céticos que questionam aspectos da religião e da Bíblia, há também multidões de pós-modernos para quem tanto faz como tanto fez. Em sua opinião, como os cristãos podem tornar relevante essa discussão sobre evidências tanto para céticos quanto para pós-modernos e/ou secularizados?

Devo dizer que, por experiência própria, é mais difícil chamar a atenção de um pós-moderno do que de um ateu. Eles não veem relevância naquilo que dizemos e não veem necessidade para a vida deles. Primeiro, a forma mais eficaz de ter essa discussão é mostrar na sua vida como isso é relevante. Eu creio plenamente que se nossa vida está de acordo com o Deus em quem cremos, isso falará mais alto que qualquer debate. O que mais mexe com essa classe de pessoas são os problemas. Se eles tiverem um problema no casamento e virem que o casamento dos “crentes” é maravilhoso, isso chama a atenção. Se eles não conseguem criar os filhos com disciplina e amor, e virem isso acontecendo em nossa vida, isso chama atenção. Então eu diria que esta é a parte mais importante: o testemunho.

Agora, em segundo lugar, precisamos convencê-los de que os fatos têm um lugar extremamente importante em como vivemos a vida. Você não pode, por exemplo, mergulhar (algo que eu gosto muito de fazer) a 30 metros de profundidade, ver que o ar do seu tanque está acabando e simplesmente ignorar esse fato. Só porque não quero que o ar esteja terminando para eu poder ficar mais um pouco debaixo d’água, isso não vai mudar o fato de que o ar está terminando. A verdade vai continuar sendo verdade, quer eu acredite nela ou não. A opção de segui-la ou não é nossa. Mas se a Bíblia e os ensinamentos dela forem verdade mesmo, há sérias consequências em escolher não viver de acordo com elas. O pós-moderno precisa entender isso, e a partir de então, as evidências que a apologética cristã apresenta serão cruciais para a aceitação dessa verdade. Se você simplesmente pregar a Bíblia para um pós-moderno ou secularizado, dificilmente haverá a resposta esperada. Agora, quando o assunto é história, arqueologia, ciência, esses são assuntos que os atraem e que podem trazer resultados.

Para você, quais são os melhores argumentos para a existência de Deus?

Se fosse apresentar todos aqui, ocuparia bastante espaço desta entrevista. Mas deixe-me resumir meus preferidos para você:

Argumento da moralidade: é meu argumento número um porque até hoje nenhum cético conseguiu me responder devidamente. O princípio é básico: existe o mal? Sim! Se existe o mal, então existe o bem. Se sabemos a diferença entre o certo e o errado, o bem e o mal, deve existir uma espécie de lei que separa um do outro (por exemplo, sei que matar é errado e sei que doar alimentos para os pobres é certo). Se existe essa “lei moral” implícita em cada ser humano, alguém tem que ter criado essa lei. Portanto, alguém foi o “doador” dessa lei para nós. A única explicação é um Deus maior que “colocou essa lei no coração humano”. Soa familiar?

Argumento histórico: nunca houve uma sociedade que não cresse num ser divino; somente isso já é uma demonstração de que a noção desse “ser” está em nós desde que nascemos e desde que há humanidade.

Argumento da origem: nada vem do nada, todos cremos nisso e até mesmo os que defendem a teoria do Big Bang entendem que nada pode ser criado sem um material anterior para fornecer essa possibilidade. Se tudo vem de alguma coisa, algo ou alguém tem de ser eterno.

Argumento teleológico: os planetas, os sistemas, as estrelas, tudo está em perfeita ordem. Como? De acordo com a Segunda Lei de Newton, todo o tipo de matéria vai da ordem para a desordem. Se realmente o mundo e tudo que existe no universo veio de uma explosão, nada deveria ser tão “organizado” assim. Somente com a explicação de um Ser inteligente por trás da criação é que podemos entender tanta perfeição.

E os melhores argumentos para convencer alguém de que a Bíblia é singular e confiável?

Profecias: não creio que exista argumento melhor do que esse. Como alguém pode escrever o que aconteceria nos mais perfeitos detalhes cem ou mil anos antes de acontecer?

Os manuscritos: nenhum documento histórico tem tantas cópias e fundamentos do que a Bíblia. Só o Novo Testamento possui mais de 5 mil cópias e 99,9% do conteúdo é extremamente confiável, em comparação uma com a outra. A proximidade dos manuscritos encontrados em relação ao tempo do acontecimento que eles relatam é muito grande. Tome por exemplo o livro de Marcos, escrito mais ou menos apenas 30 anos após a morte de Jesus! Isso não acontece com qualquer outro documento.

Arqueologia: apesar de a arqueologia ser limitada por não poder provar a existência de Deus ou a divindade de Jesus, ela tem confirmado diversos eventos, pessoas e locais que estão descritos na Bíblia.

Os perdedores: normalmente se acredita que os “vencedores” são aqueles que escrevem a história, e sempre a seu favor. Percebe-se a originalidade da Bíblia no sentido que ela não “conta vantagem”: foram os mártires, os perseguidos, os crucificados, os odiados e os pobres que a escrevem. Por quê? Para manter a verdade em pé!

Transformação: talvez na atualidade o melhor argumento que a maioria dos cristãos daria, e que não deixa de ser real e confiável, é a transformação que a Bíblia opera na vida de milhões de pessoas. Qual a primeira coisa que você faz antes de comprar um produto pela internet? Você verifica a opinião daqueles que já compraram. Se existe alto índice de desaprovação, provavelmente você irá atrás de outro produto ou outra marca. Mas se a aprovação é geral, você saberá que o produto é confiável. Ao ver tantas pessoas relatando mudanças de vida, coisas que provavelmente elas nunca conseguiriam sozinhas, constatamos que esse Livro, que essa mensagem tem muito poder!

As pessoas devem aceitar Deus e se relacionar com Ele pela fé ou pela razão? Ou ambas?

Como eu disse anteriormente, Deus pede para nós O amarmos com as duas coisas. Deus não nos deu um cérebro para pesarmos 1,5 kg a mais na balança. Ele nos deu o cérebro com a finalidade principal de vermos as provas e evidências que Ele nos deixou de Sua existência. Tanto por meio da grandeza do universo e das belezas naturais, quanto de fatos históricos e filosóficos que nos levam a ter certeza de que não existe outra saída a não ser confiar nossa vida e nosso futuro nas mãos dEle. A fé tem seu lugar, um importantíssimo lugar, diga-se. Existe um ponto que a razão não ultrapassa. Aquele ponto que os crentes e os descrentes não conseguem entender. Coisas que a razão não pode perscrutar, como a divindade de Cristo, a confiança nos planos de Deus, o Céu. Como será o Céu? A Bíblia diz que nem olhos viram nem ouvidos ouviram o que Deus tem preparado para nós. Existem coisas que só uma fé bem embasada pode compreender. Mas isso não é desculpa para não exercitarmos a razão.

O ateísmo militante vem ganhando força. A que você atribui esse fenômeno?

Creio que o principal motivo seja o pseudo-intelectualismo que a mídia tem nos trazido. É só passar alguns minutos na internet, ler revistas como a Superinteressante ou assistir ao Discovery Channel para entender de onde vêm essas ideias extremamente mal fundamentadas. As pessoas querem acreditar em tudo o que puderem para se livrar do compromisso e da vida disciplinada. Se elas encontram “base” para sua vida embalada a álcool, drogas, sexo ilimitado e irresponsável, mentiras e traições, não abrirão mão disso nem que um anjo apareça na frente delas. Não digo que esses ateus são pessoas más; alguns realmente acreditam que inventaram a roda – meu pai mesmo é uma das melhores pessoas que eu conheço –, mas preferem saber apenas sobre um lado da “moeda”, sem ver que existe um exército de advogados e boas evidências do lado do cristianismo também.

Qual a melhor maneira de um cristão dialogar com um ateu?

Primeiro, tem que haver muita paciência. A vontade é de sair falando “um monte” e muitas vezes de “aumentar” as evidências onde elas não existem. Já vi muitas pessoas usarem, por exemplo, a “prova” da arca de Noé lá no Ararate para defender a Bíblia, ou o e-mail dos “gigantes” encontrados. Não é por aí. Se você falar essas coisas pata um ateu culto, estará prestando um grande desfavor para a apologética! Estude e pesquise muito antes de entrar em uma discussão, pois muitas vezes sua própria fé pode ser abalada. Não encare esse tipo de coisa como evangelismo; é muito mais sério e muito mais difícil.

Tem que haver respeito, de ambas as partes. Se o ateu é daqueles arrogantes e blasfemadores, minha dica é que deixe o tempo cuidar dessa pessoa, ou espere momento mais apropriado para falar. Dificilmente conseguiremos convencer alguém assim de alguma coisa. Porém, se for um ateu de mente aberta, faça mais perguntas do que dê respostas. Ateus são muito bons em perguntar, mas péssimos em responder. O método de Jesus continua sendo o melhor de todos: responda uma pergunta com outra pergunta. As brechas históricas e filosóficas do ateísmo são enormes; aproveite-se disso. Não faça referências a sites não oficiais, programas de TV, e muito menos a seu pastor para responder às perguntas. Faça referências a cientistas cristãos, ou até mesmo a ateus famosos que admitiram em certo ponto alguma crença teísta, e também a cientistas e historiadores não cristãos, mas que deram “corda” para o cristianismo. Lembre-se sempre de ir acompanhado com a presença do Espírito Santo; não pense que esse é um trabalho que você pode fazer sozinho. Você precisará das palavras certas e do conhecimento que só Ele pode dar.

Que livros você recomendaria para quem quer fazer uma defesa racional e consistente da fé cristã?

Infelizmente, o estoque de livros em português disponíveis na área da apologética é extremamente restrito. Se você lê inglês ficará muito mais fácil. Mas aqui vão algumas sugestões: Em Defesa da Fé e Em defesa de Cristo, ambos do jornalista ex-ateu Lee Strobel; O Delírio de Dawkins, de Alister McGrath e Joanna McGrath; Por Que Jesus é Diferente? e Pode o Homem Viver Sem Deus?, de Ravi Zacharias; Ortodoxia e O Homem Eterno, de G. K. Chesterton; Ele Andou Entre Nós, de Josh McDowell; Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu, de Norman Geisler e Frank Turek; Ensaios Apologéticos, de Francis Beckwith, William Craig e J. P. Moreland.